Campo Grande (MS), Sábado, 18 de Janeiro de 2025

ARTIGOS| Gritos de socorro no espelho das aguadas

05/06/2020

09:41

PA

Autor: Paulo Paim (*)
A insensatez do atual governo e suas políticas de confronto, de ameaças e ataques à democracia, aos direitos humanos e ao meio ambiente e o descaso no combate à Covid-19 têm levado o país à total desmoralização internacional. A cada dia, somos deixados de lado e excluídos dos grandes debates e discussões.

Recentemente, a ONU chamou um grupo de 50 países para debater justiça social e questões climáticas na pós-pandemia. Ficamos de fora. A OMS realizou um encontro com os principais presidentes do mundo para criar uma nova aliança internacional de combate à Covid-19, por meio de um fundo de R$ 45 bilhões. O Brasil não foi convidado.

A embriaguez do poder e a espada ideológica têm sido fatores decisivos nesta junção de indecências, misérias e ambiguidades de governança. O próprio ministro do Meio Ambiente deixa claro a sua postura antiambiental e o desejo de mudanças na legislação para beneficiar grandes grupos econômicos, madeireiros, garimpeiros.

Foram anos de avanços e de consolidação da legislação. Agora, estamos assistindo toda uma desconstrução da política ambiental brasileira. O país não suporta mais esse cenário de degradação das suas florestas e de seus mananciais e de desrespeito com as comunidades tradicionais que vivem nesse ambiente.

Somente no ano de 2019, foram identificadas 26 violações nessa área feitas pelo atual governo. Entre elas, destacam-se a desestruturação do IBAMA e do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade e a flexibilização e redução das multas por crimes ambientais.

O país abriu mão do Fundo Amazônia. Vários projetos de combate ao desmatamento, conservação, produção e geração de emprego e renda estão parados. Poderíamos ter recebido da Alemanha e Noruega em 2019 mais de R$ 1 bilhão. Entre os anos 2009 e 2018, 103 projetos foram beneficiados.

O INPE aponta que, no ano passado, houve um aumento de 83% das queimadas em relação a 2018, com 72.843 focos de incêndios. Em efeito dominó, as chamas se alastram pela Amazônia. Estudos mais avançados explicitam a grandiosidade do problema. Satélites detectam a destruição.

Segundo o Greenpeace, com dados do sistema que fornece alertas de onde o desmatamento está ocorrendo em tempo real (Deter), entre agosto de 2019 e março de 2020, na Amazônia, foram identificados 5.260 km² com alertas, quase o dobro do que foi registrado no mesmo período entre 2018 e 2019 (98% de crescimento).

Desmatamentos equivalem hoje no país ao tamanho de cidades inteiras como Porto Alegre e Maceió. Os estados do Pará, Mato Grosso, Amazonas e Rondônia lideram o ranking com avanço sobre terras indígenas e quilombolas, assentamentos da reforma agrária e unidades de conservação.

�??Desmatamento, grilagem e assassinato de indígenas também estão aumentando�?�, disse o cacique Awapy Uru-Eu-Wau-Wau à Deutsche Welle da Alemanha. O Projeto de Lei 2633/2020 é a �??coroação de todas as ações ilícitas�?� de desmatamento que vêm ocorrendo na Amazônia.

Na Mata Atlântica, a situação não é diferente. Entre os anos 2018 e 2019, o desmatamento atingiu 27%, segundo estudo da Fundação SOS Mata Atlântica em parceria com o INPE. 14.502 hectares foram desmatados. Apenas 12,4% da área original da floresta ainda sobrevive, ou seja, 15,3 milhões de hectares.

Não podemos silenciar aos sonidos e estrondos de uma árvore que é derrubada e nem as queimadas que sufocam o ar e matam o canto dos pássaros. Quando as águas são contaminadas e as sementes não mais brotam, eis que o vento para de soprar e o que antes era vida e azul do céu se torna a mais insignificante das existências.

Como esquecer a dor dos desastres ambientais de Mariana e Brumadinho e tantos outros que se perderam no tempo esfumaçado dos anos? Vidas foram levadas e famílias destruídas, sonhos e quimeras acorrentados, flora e fauna agredidas, animais mortos, vertentes poluídas pela ganância dos homens.

Insistir na instalação de mineradoras junto às bacias hidrográficas e proximidades de centros urbanos é insistir no erro, na ignorância, na estupidez e no desprezo à vida e à eternidade. Estaríamos assim escrevendo e prevendo desastres e prejuízos socioambientais e econômicos incalculáveis�?� Triste ironia.

Há Gritos de socorro cruzando o país inteiro e refletindo no espelho das aguadas. Ficaremos omissos? Aceitaremos pacificamente o caos ambiental? A sociedade precisa tomar consciência dessa situação alarmante que está destruindo o nosso verde e as nossas águas para agir com força e de maneira decisiva, conjugando todos os esforços para o seu enfrentamento.

O país tem que estar à altura desse desafio, buscando garantir políticas públicas eficazes de preservação, proteção e fiscalização que possibilitem o desenvolvimento sustentável com soberania. Temos que olhar para todos os biomas: Amazônia, Cerrado, Caatinga, Mata Atlântica, Pantanal e Pampa. Meio ambiente é questão de Estado.

Quando penso em um Brasil exercendo a democracia plena, a Constituição sendo respeitada�?� Um país mais humano, solidário e fraterno, que priorize a inclusão social, direitos e oportunidades iguais para todos e todas, eu penso na revolução pacífica de Tiago de Melo, o poeta da floresta.

�??Volto armado de amor para trabalhar cantando na construção da manhã. Reparto a minha esperança e planto a clara certeza da vida nova que vem. Aprendi que na verdade o que importa, antes que a vida apodreça, é trabalhar na mudança do que é preciso mudar. Cada um na sua vez, cada qual no seu lugar�?�.

(*) Senador (PT/RS). Presidente da Comissão de Direitos Humanos do Senado.

Os comentários abaixo são opiniões de leitores e não representam a opinião deste veículo.

Últimas Notícias

Veja Mais

Envie Sua Notícia

Envie pelo site

Envie pelo Whatsapp

Municípios

Rebouças Renascença Reserva Reserva do Iguaçu Ribeirão Claro Ribeirão do Pinhal Rio Azul Rio Bom Rio Bonito do Iguaçu Rio Branco do Ivaí Rio Branco do Sul Rio Negro Rolândia Roncador Rondon Rosário do Ivai Sabáudia Salgado Filho Salto do Itararé Salto do Lontra Santa Amélia Santa Cecília do Pavão Santa Cruz Monte Castelo Santa Fé Santa Helena Santa Inês Santa Isabel do Ivaí Santa Izabel do Oeste Santa Lúcia Santa Maria do Oeste Santa Mariana Santa Mônica Santa Tereza do Oeste Santa Terezinha de Itaipu Santana do Itararé Santo Antônio da Platina Santo Antônio do Caiuá Santo Antônio do Paraíso Santo Antônio do Sudoeste Santo Inácio Sapopema Sarandi Saudade do Iguaçu São Carlos do Ivaí São Jerônimo da Serra São João São João do Caiuá São João do Ivaí São João do Triunfo São Jorge d'Oeste São Jorge do Ivaí São Jorge do Patrocínio São José da Boa Vista São José das Palmeiras São José dos Pinhais São Manoel do Paraná São Mateus do Sul São Miguel do Iguaçu São Pedro do Iguaçu São Pedro do Ivaí São Pedro do Paraná São Sebastião da Amoreira São Tomé Sengés Serranópolis do Iguaçu Sertanópolis Sertaneja Siqueira Campos Sulina Tamarana Tamboara Tapejara Tapira Teixeira Soares Telêmaco Borba Terra Boa Terra Rica Terra Roxa Tibagi Tijucas do Sul Toledo Tomazina Três Barras do Paraná Tunas do Paraná Tuneiras do Oeste Tupãssi Turvo Ubiratã Umuarama União da Vitória Uniflor Uraí Ventania Vera Cruz do Oeste Verê Vila Alta Virmond Vitorino Wenceslau Braz Xambrê

ParanAgora © 2021 Todos os direitos reservados.

PROIBIDA A REPRODUÇÃO, transmissão e redistribuição sem autorização expressa.

Site desenvolvido por: